quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

FELIZ ANO NOVO E BOAS VINDAS A TODOS!!!

OLÁ PESSOAL,

Gostaria de desejar um Feliz Ano Novo para todos, e avisá-los que atualizei algumas postagens do segundo semestre de 2010, pois estavam incompletas.
Um grande abraço a todos.

E que este ano seja abençoado para todos nós.

RESUMO GESTÃO II - APS - AULAS 1 A 8.

RESUMO ELABORADO A PARTIR DOS TEXTOS SELECIONADOS POR MARIA LUIZA SUSSEKIND.


Resumo de Gestão II – Textos 1, 2 e 3

Texto 1 – A utopia da gestão escolar democrática

Toda vez que se propõe uma gestão democrática da escola pública de 1º e 2º graus que tenha efetiva participação de pais, educadores, alunos e funcionários da escola, isso acaba sendo considerado como coisa utópica.
Da classe dominante não se pode esperar nenhuma iniciativa de transformação em favor das camadas dominadas (e, no caso, no que se refere à escola), sem pressão por parte dos interessados. Além dessa premissa, coloco como horizonte a transformação do esquema de autoridade no interior da escola. À medida que o horizonte se articula com os interesses dominados, o processo de transformação da autoridade deve constituir-se no próprio processo de conquista da escola pela classe trabalhadora. Esta constatação deriva de uma visão não muito otimista a respeito da função desempenhada pela escola na sociedade hoje.
Infelizmente a escola que está aí, esta é sim reprodutora de uma certa ideologia dominante, negadora dos valores dominados e mera chanceladora da injustiça social, na medida em que se recoloca as pessoas nos lugares reservados pelas relações que se dão no nível da estrutura econômica.
O que temos hoje é um sistema hierárquico que pretensamente coloca todo o poder nas mãos do diretor. Não é possível falar das estratégias de se transformar o sistema de autoridade no interior  da escola, em direção a uma efetiva participação de seus diversos setores, sem levar em conta a dupla contradição que vive o diretor  da escola hoje. Esse diretor, por um lado, é considerado a autoridade máxima no interior da escola: e isso, pretensamente, lhe daria um grande poder e autonomia, mas por outro lado, ele acaba se constituindo, de fato, em virtude de sua condição de responsável último pelo cumprimento da Lei e da Ordem da escola, em mero preposto do Estado. A segunda advém do fato de que, por um lado, ele deve deter uma competência técnica e um conhecimento dos princípios e métodos necessários a uma moderna e adequada administração dos recursos da escola, mas, por outro sua falta de autonomia em relação aos escalões superiores e a precariedade das condições concretas em que se desenvolvem as atividades no interior da escola tornam uma quimera a utilização dos belos métodos e técnicas adquiridos (pelo menos supostamente) em sua formação de administrador escolar, já que o problema da escola pública no país não é, na verdade, o da administração de recursos, mas o da falta de recursos.
Na medida em que se conseguir a participação de todos os setores da escola – educadores, alunos, funcionários e pais – nas decisões a respeito de seus objetivos e de seu funcionamento, ter-se-á melhores condições para pressionar os escalões superiores no sentido de dotar a escola  de autonomia e recursos.
Uma medida constitucional de caráter geral poderia concorrer para que a escola, enquanto instituição articulada com os interesses dominados, tivesse facilitada sua atividade de pressão junto ao Estado, na medida em que, por meio de uma associação de pais ou entidade semelhante, pudesse defender mais efetivamente seus direitos com relação ao ensino. Não basta permitir formalmente que os pais de alunos participem da administração da escola; é preciso que haja condições materiais propiciadoras dessa participação.
A utopia de uma escola participativa, aceita a necessidade, ou a imprescindibilidade, da participação efetiva da classe trabalhadora nas decisões que dizem respeito a educação de seus filhos, se procura identificar as condições de possibilidade dessa participação e se buscam mecanismos necessários a distribuição da autoridade no interior da escola, de modo adequá-la ao mister, de ao mesmo tempo em que se procura formas democráticas de alcance dos objetivos educacionais a ela inerente, se constitua em mecanismos de pressão junto ao Estado e a classe detentora de poder, no sentido de serem propiciadas as condições que possibilitem o seu funcionamento e autonomia.

Texto 2 – AVALIAÇÃO E GESTÃO DEMOCRÁTICA NA REGULAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA BRASILEIRA: UMA RELAÇÃO A AVALIAR

O uso corriqueiro do termo gestão e da expressão gestão democrática está impregnado de imprecisões e obscuridade, a ponto de servirem para designar realidades diversas. Silva Júnior (2002) constatou que,
No imaginário coletivo e em consideráveis segmentos do discurso educacional
brasileiro, gestão significa gestão empresarial, o que leva ao embotamento da
produção do significado de gestão educacional e à mercadorização de seus
critérios de ação.
O termo gestão sofreu um processo de adjetivação. De modo que hoje é preciso um esforço teórico para que se possa apreender não só o emprego desse termo, mas, principalmente, a lógica e os fundamentos de sua qualificação. Esse esforço é indispensável para o correto discernimento dos qualificativos da gestão educacional, encontrando-se, entre os mais usuais, estes: gestão democrática, gestão participativa, gestão dialógica, gestão compartilhada, gestão gerencial, gestão estratégica, gestão da qualidade total.
Para Silva Júnior (op. cit.), a qualificação da gestão como “democrática” e “participativa” tem se revelado um jogo conceitual intencional, cujo desdobramento sobrepõe esses adjetivos ao qualificativo “pública”. Isso favorece a crescente prevalência da lógica do mercado educacional sobre a do direito à educação. Não se trata, portanto, de uma questão de somenos importância. Para o autor, a expressão “gestão pública” seria a mais apropriada para denominar o sentido de uma gestão que rejeita a imposição de práticas de administração privada na administração pública.

Regulação jurídico-legal: a gestão democrática e o lugar da avaliação
Importante como se deu a inscrição da expressão gestão democrática da educação na regulação jurídico-legal vigente e, ao mesmo tempo, ressaltar o lugar da avaliação nessa concepção de gestão, bem como a relação entre elas. Para tanto, a análise parte de uma perspectiva histórica. Considera, de um lado, as propostas formuladas nos anos de 1980-1990 por entidades da área educacional nas Conferências Brasileiras de Educação (CBEs), no Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública (FNDEP)e em Congressos Nacionais de Educação (CONEDs). De outro lado, foca projetos de leis de autoria e defendidos pelo Ministério da Educação (MEC) e o ordenamento jurídico-legal construído no período de 1988-2001.

Avaliação e gestão democrática: uma relação a ser avaliada
O que se viu foi o lugar que foi dado ou não à avaliação educacional na construção da noção de  gestão democrática na regulação jurídico-legal brasileira vigente. Essa regulação propicia e
instrumenta práticas de  gestão comprometidas com relações mais democráticas entre os envolvidos e, implicitamente, indica parâmetros de sua avaliação. Esta passou a ser um dos meios para a participação na administração pública pelos cidadãos, vistos como “usuários dos serviços públicos”.
Mesmo que o ordenamento constitucional não estabeleça explícita associação da avaliação com o princípio de gestão democrática e nem determine de forma direta a necessária inter-relação dessas práticas, nota-se que ele não coloca entrave para os esforços de qualificação de ambas as práticas, ainda que o financiamento educacional não a favoreça. Logo, a relação/inter-relação de gestão e avaliação na educação emerge como objeto avaliativo.
Entende-se que tal inter-relação pode ser importante condição para a difusão de valores democráticos e republicanos e, principalmente, do caráter pedagógico e educativo de ambas as práticas.
A prática da avaliação concorre para a configuração de um padrão de  gestão mais ou menos próximo/distante do ideal democrático propugnado por esferas públicas, pois a avaliação é um dos componentes constituintes da gestão. Assim, tanto a forma como se dá a prática da avaliação como a inexistência dela expressam os fundamentos, o caráter e o grau do compromisso de democratização de determinada gestão. A forma como se avalia pode ser bem mais reveladora da democratização ou não da gestão do que a existência de processos e mecanismos de eleição, ação colegiada, ação coletiva e participativa.
O valor e a utilidade da avaliação para a gestão democrática precisam ser considerados como critérios de aferição da pertinência da avaliação efetuada. E, como manifestação da própria concepção de gestão democrática prevalecente, pode essa prática, examinada em seu valor e
utilidade, revelar e orientar escolhas relativas à vivência democrática na educação.

Texto 3 - Política e administração da educação: Um estudo de algumas reformas recentes implementadas no estado de Minas Gerais

A partir do início desta década temos assistido a um movimento inédito de formulações de propostas no âmbito da administração educacional. São medidas que vêm interferindo na administração dos sistemas de ensino municipais, estaduais e federal. Estas medidas são
justificadas pela necessidade de responder aos apelos da sociedade civil em torno da universalização do ensino básico ou pela necessidade de responder às demandas econômicas ditadas pelas transformações ocorridas no mundo do trabalho. É dentro deste contexto que alguns estados brasileiros têm adotado nos últimos anos projetos voltados para a reordenação de suas redes escolares, provocando mudanças significativas na organização e no funcionamento das escolas, na sua estrutura administrativa e na composição do quadro de pessoal.
Em 1991 o governo do estado de Minas Gerais anuncia um programa de melhoria da qualidade do ensino fundamental – posteriormente denominado Proqualidade. Este programa tem como objetivo central a eliminação do “fracasso escolar”.
A partir das resoluções da Conferência Mundial de Educação Para Todos, realizada em 1990 na Tailândia, o Banco Mundial passou a elaborar novas diretrizes para as décadas futuras. Como agência de fomento ao desenvolvimento internacional vinculada ao FMI, o Banco tem por finalidade precípua participar do desenvolvimento econômico de seus países-membros. Segundo Fonseca (1995), embora sejam diversas as modalidades de empréstimos feitos pelo Bird, os financiamentos concedidos à educação brasileira seguem as mesmas regras fixadas para qualquer projeto comercial.
Torres (1995), chama a atenção para o fato de que o Bird é uma agência de regulação no contexto do capitalismo internacional, que faz empréstimos e, como tal, faz exigências, tomando muitas vezes a iniciativa de sugeri-los.
As ações a serem desenvolvidas pelo Proqualidade, coerentes com os princípios estabelecidos na Conferência de Jontiem na Tailândia, estão dispostas em cinco prioridades:
• busca permanente da autonomia da escola em seus aspectos pedagógicos, administrativos e financeiros;
• fortalecimento da direção da escola, principalmente através da mudança no processo de seu preenchimento, seleção competitiva interna, seguida da escolha pela comunidade escolar;
• desenvolvimento e profissionalização de professores, especialistas e demais servidores da educação, como forma de garantir-lhes uma carreira no setor público baseada no aperfeiçoamento profissional e na avaliação do desempenho de suas atividades;
• avaliação de desempenho das escolas: dos resultados acadêmicos e da auto-avaliação;
• promoção da articulação do estado com os municípios, como forma de otimizar a utilização dos recursos públicos aplicados em educação.

Alguns indicadores de mudanças na configuração dos sistemas públicos de ensino
No período inicial de implantação do Proqualidade – 1993/1994 e 1994/1995 –, a matrícula
na rede estadual apresenta os menores índices de crescimento, com uma expressiva taxa de 10% de crescimento da matrícula na rede municipal no período de 1993/1994.
A diminuição do número de alunos atendidos pela rede particular no estado pode constituir-se num indicador significativo da perda de rendimentos dos setores médios na sociedade.
A diminuição dos números absolutos da matrícula efetiva na rede estadual coincide com o momento do anúncio das prioridades de obtenção de maior eficiência para a educação em Minas Gerais. Destacamos que dentre as prioridades justificadas na busca de maior eficiência no gerenciamento do sistema, inclui-se uma política de descentralização que se articula com
propostas de municipalização.
Verifica-se a concretização de iniciativas de municipalização do ensino fundamental no estado, pela redução da participação da rede estadual nas quatro primeiras séries.
A preocupação com os resultados decorre, mais especificamente, de uma concepção de política em que os fins pretendidos podem ser múltiplos e até mesmo antagônicos.
Supomos  que o padrão de formulação da política educacional empreendido nos últimos anos fundamenta-se numa tradição autoritária que, se por um lado incorpora temas de reivindicações populares,por outro o faz reelaborando-os em face dos interesses hegemônicos.
O Poder Executivo prioriza medidas de redistribuição dos recursos existentes como requisito de expansão dos serviços para aqueles considerados como “carentes”.  A permanência da justificativa de falta de novos recursos a serem destinados para a expansão dos sistemas de
ensino e demais políticas sociais tem implicado a adoção de medidas que viabilizam a expansão, porém sustentada em precárias condições de trabalho e baixa qualidade dos serviços oferecidos.

Os atos administrativos e a reestruturação da rede de ensino estadual
O recurso à subcontratação da força de trabalho, melhor caracterizado pelo termo terceirização, vem se tornando prática freqüente nas gestões empresariais calcadas na racionalidade da produção enxuta. São medidas implementadas sob o manto da necessária flexibilização da produção, que na verdade acabam por generalizar-se em contratos mais voláteis de trabalho, em que os encargos sociais e os benefícios trabalhistas são sonegados ao estado e negados aos trabalhadores, que durante muitos anos de lutas inscreveram-nos como conquistas sociais.
Estes trabalhadores, justamente por encontrarem-se em relações contratuais desiguais entre si, e entre os efetivos, muitas vezes são considerados menores, menos capacitados, colocados a desempenhar as tarefas mais sofríveis. Esta tendência dos atuais modelos de gestão tem provocado uma segmentação no mercado de trabalho que reflete no interior do processo, traduzindo-se em competições entre efetivos e temporários, primeiros e terceiros, qualificados e (des)qualificados.
A este respeito, os efeitos das políticas implementadas em relação ao magistério da rede estadual confirmam esta crescente insegurança. Documento da SEE-MG, intitulado “Integração com os municípios, relatório 1991/95”, ao destacar as principais dificuldades encontradas na implantação da proposta de integração estado/município, afirma:
2 - Resistência do conjunto de  professores:
- da rede municipal – temem a redução dos salários em função da ampliação da rede;
- da rede estadual – temem a gestão política da escola, pela administração municipal; os professores designados temem a dispensa do emprego (sic);
3 - Resistência de diretores das escolas estaduais: temem perder o cargo de diretores e tentam preservar a equipe da escola já que, sempre que a escola é municipalizada, ocorre redução de pessoal, especialmente pessoal auxiliar.
O princípio constitucional de gestão democrática – artigo 206 da Constituição Federal – em Minas Gerais traduziu-se no Proqualidade. Este programa traz orientações que definem medidas consideradas necessárias para uma administração competente, eficaz e participativa do sistema de ensino público. Porém, é importante destacar de que fórmulas se compõem tais indicações. As resoluções 7.762, 7.763, 7.764 são publicadas no momento em que o estado começa a divulgar os primeiros resultados positivos que obteve com o programa.
As resoluções 7.762, 7.763, 7.764 articulam as prioridades fixadas pelo Proqualidade:
a)      Na medida em que modificam os critérios de composição do quadro escolar e os critérios de enturmação provocando mudanças na forma como o trabalho é organizado na escola resultando em novos critérios de qualificação e produtividade docente;
b)      Quanto à valorização do magistério, em obediência ao princípio constitucional, durante anos a SEE-MG contou com contratos temporários para cobrir a carga letiva, em vez de adotar um plano de carreira, com um piso salarial digno;
c)       Para proceder aos ajustes administrativos que resultaram na dispensa de servidores o órgão estadual de administração do sistema de ensino fundamentou-se em duas diretrizes: critérios de composição do quadro de pessoal por unidade escolar, o que definiu o percentual numérico a ser cortado, e avaliação de desempenho nos termos da instrução normativa nº 3,publicada no Minas Gerais de 21 de janeiro de 1995,  e efetuada nas escolas no decorrer do ano. Declarações do secretário-adjunto de Educação, publicadas na imprensa estadual, consideram que os servidores dispensados são aqueles que apresentaram um desempenho de “sofrível a ruim”;
d)      Implementa uma metodologia de atuação em que cabe às unidades escolares deliberar sobre quem deve perder seus empregos. A Secretaria trata de dados estatísticos, fixando diretrizes para um ajuste administrativo, responsabilizando as direções de unidade e os órgãos colegiados pela tarefa de demitir pessoas frente a frente.
Os movimentos sociais, que conduziram a democratização dos anos 80, questionaram fortemente a qualidade e as condições do trabalho docente nas redes públicas de ensino elementar. Estes temas foram apropriados por diferentes governos e, principalmente, nesta última década,(re)significados. Enfatiza-se a possibilidade de melhores condições de trabalho a partir de alterações nos critérios de produtividade docente, ou seja, melhorias salariais futuras ou dos equipamentos são vinculadas à implementação de medidas que reduzam a relação custo/benefício do sistema. Com relação à melhoria da qualidade do ensino, a centralidade das discussões pedagógicas, que enfatizavam a introdução de novos conteúdos, metodologias e condições de trabalho, foi deslocada pela prioridade no gerenciamento do fluxo escolar. Participação, maior autonomia e descentralização são vinculadas a programas de municipalização, que podem fragmentar princípios de universalização dos sistemas.


Resumo de Gestão 2  - Texto 4

Texto 4:
ABORDAGEM DO CICLO DE POLÍTICAS: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A ANÁLISE DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS
O ciclo de políticas – idéias centrais
A abordagem do “ciclo de políticas”, que adota uma orientação pós-moderna, baseia-se nos trabalhos de Stephen Ball e Richard Bowe, pesquisadores ingleses da área de políticas educacionais. Essa abordagem destaca a natureza complexa e controversa da política educacional.
A princípio, Ball & Bowe (1992) tentaram caracterizar o processo político, introduzindo a noção de um ciclo contínuo constituído por três facetas ou arenas políticas: a política proposta, a política de fato e a política em uso.A primeira faceta, a “política proposta”, referia-se à
política oficial, relacionada com as intenções não somente do governo e de seus assessores, departamentos educacionais e burocratas encarregados de “implementar” políticas, mas também intenções das escolas, autoridades locais e outras arenas onde as políticas emergem. A “políticade fato” constituía-se pelos textos políticos e textos legislativos que dão forma à política proposta e são as bases iniciais para que as políticas sejam colocadas em prática. Por último, a “política em uso” referia-se aos discursos e às práticas institucionais que emergem do processo de implementação das políticas pelos profissionais que atuam no nível da prática.
Porém, Stephen Ball e Richard Bowe romperam com essa formulação inicial porque a linguagem utilizada apresentava uma certa rigidez que eles não desejavam empregar para delinear o ciclo de políticas.
Aquelas  três facetas ou arenas se apresentavam como conceitos restritos, opondo-se ao modo pelo qual eles queriam representar o processo político. No livro Reforming education and changing schools, publicado em 1992, Bowe & Ball apresentaram uma versão mais refinada do ciclo de políticas. Nesse livro, eles rejeitam os modelos de política educacional que separam as fases de formulação e implementação porque eles ignoram as disputas e os embates sobre a política e reforçam a racionalidade do processo de gestão.
Os autores propuseram um ciclo contínuo constituído por três contextos principais: o contexto de influência, o contexto da produção de texto e o contexto da prática. Esses contextos estão inter-relacionados, não têm uma dimensão temporal ou seqüencial e não são etapas lineares. Cada um desses contextos apresenta arenas, lugares e grupos de interesse e cada um deles envolve disputas e embates.
O primeiro contexto é o contexto de influência onde normalmente as políticas públicas são iniciadas e os discursos políticos são construídos. É nesse contexto que grupos de interesse disputam para influenciar a definição das finalidades sociais da educação e do que significa ser
educado. Atuam nesse contexto as redes sociais dentro e em torno de partidos políticos, do governo e do processo legislativo. É também nesse contexto que os conceitos adquirem legitimidade e formam um discurso de base para a política.
O contexto de influência tem uma relação simbiótica, porém não evidente ou simples, com o segundo contexto, o contexto da produção de texto. Ao passo que o contexto de influência está freqüentemente relacionado com interesses mais estreitos e ideologias dogmáticas, os textos políticos normalmente estão articulados com a linguagem do interesse público mais geral. Os textos políticos, portanto, representam a política. Essas representações podem tomar várias formas: textos legais oficiais e textos políticos, comentários formais ou informais sobre os textos oficiais, pronunciamentos oficiais, vídeos etc. Tais textos não são, necessariamente, internamente coerentes e claros, e podem também ser contraditórios. Eles podem usar os termos-chave de modo diverso. A política não é feita e finalizada no momento legislativo e os textos precisam ser lidos com relação ao tempo e ao local específico de sua produção. Os textos políticos são o resultado de disputas e acordos, pois os grupos que atuam dentro dos diferentes lugares da produção de textos competem para controlar as representações da política (Bowe et al.,1992). Assim, políticas são intervenções textuais, mas elas também carregam limitações materiais e possibilidades. As respostas a esses textos têm conseqüências reais. Essas conseqüências são vivenciadas dentro do terceiro contexto, o contexto da prática.
Num artigo subseqüente, Ball (1993a) explicitou mais claramente a distinção entre “política como texto” e “política como discurso”. A conceituação de política como texto baseia-se na teoria literária que entende as políticas como representações que são codificadas de maneiras
complexas. Sobre a política como discurso, Ball (1993a) explica que os discursos incorporam significados e utilizam de proposições e palavras, onde certas possibilidades de pensamento são construídas. A política como discurso estabelece limites sobre o que é permitido pensar e tem o efeito de distribuir “vozes”, uma vez que somente algumas vozes serão ouvidas como legítimas e investidas de autoridade. Desse modo, com base em Foucault, Ball explica que as políticas podem tornar-se “regimes de verdade”. Política como texto e política como discurso são conceituações complementares. Ao passo que a política como discurso enfatiza os limites impostos pelo próprio discurso, a política como texto enfatiza o controle que está nas mãos dos leitores.
O último contexto do ciclo de políticas é o contexto de estratégia política. Esse contexto envolve a identificação de um conjunto de atividades sociais e políticas que seriam necessárias para lidar com as desigualdades criadas ou reproduzidas pela política investigada.
No ciclo de políticas a simplicidade e a linearidade de outros modelos de análise de políticas são substituídas pela complexidade do ciclo de políticas. A abordagem do ciclo de políticas traz várias contribuições para a análise de políticas, uma vez que o processo político é entendido como multifacetado e dialético, necessitando articular as perspectivas macro e micro.
Na extensa literatura de política educacional publicada em língua inglesa, as tensões entre referenciais analíticos que enfatizam o controle do Estado e aqueles que enfatizam a interpenetração entre macro e microcontextos e influências têm sido bastante debatidas.
Roger Dale (Dale, 1989 e 1992) é considerado um dos mais importantes defensores da abordagem estadocêntrica no processo de formulação e análise de políticas educacionais.
Essa abordagem enfatiza o papel das macroinfluências sobre os profissionais que atuam no nível micro. Entretanto, ele enfatiza que o Estado não é monolítico nem sinônimo de governo. Ozga (1990) apóia a abordagem de Dale e tem salientado que os modelos estadocêntricos são suficientemente capazes para acomodar a complexidade e a diferença e que é apenas de forma caricaturada que o modelo estadocêntrico parece ser muito determinista.
Para Dale(1992), focalizar o Estado não é apenas necessário, mas constitui o “mais importante componente de qualquer compreensão adequada da política educacional.

Críticas à abordagem do ciclo de políticas
O referencial teórico-analítico do ciclo de políticas formulado por Ball e Bowe gerou vários debates entre autores ingleses, americanos e australianos ligados ao campo da análise de políticas educacionais.
Lingard (1993) argumenta que o ciclo de políticas precisa de uma teoria de Estado mais sofisticada. A partir de uma perspectiva marxista,Hatcher & Troyna (1994) consideram que a abordagem do ciclo de políticas não tem uma teoria de Estado clara, o que seria crucial para uma adequada compreensão da política educacional e de suas relações com os interesses econômicos. Na realidade, Ball (1990) tentou oferecer uma resolução para a lacuna teórica entre uma perspectiva neomarxista (centrada no Estado) com suas “generalidades ordenadas” (ênfase em questões mais amplas) e uma perspectiva pluralista com suas “realidades desordenadas de influência, pressão, dogmas, conflitos, acordos, intransigência, resistência, erros, oposição e pragmatismo”. Isso levou Lingard (1993) e Hatcher & Troyna (1994) a argumentarem que Ball é inconsistente em sua abordagem.
A influência de Foucault e a falta de uma perspectiva feminista foram também apontadas por Henry (1993), Hatcher & Troyna (1994) e Lingard (1996). Henry (1993) afirma que falta na abordagem do ciclo de políticas de Ball o engajamento com as perspectivas neomarxistas e feministas. Em sua resposta, Ball (1993b) concordou com as críticas de Henry, mas reiterou o contraste entre o “desordenamento” que caracteriza a realidade das políticas e a abordagem macroanalítica, preocupada com a análise de questões mais amplas.
Hatcher & Troyna (1994) dizem que a abordagem proposta por Ball não resolveu a lacuna entre o pluralismo e o marxismo, porque a instância criada por ele favorece o pluralismo. Ball (1994b) considera que o argumento de Hatcher & Troyna é estruturalmente determinado e estático.
Lingard (1996) ressalta que o ciclo de políticas de Ball contribuiu teórica e empiricamente para a análise de políticas, mas afirma que ele não considerou a questão dos efeitos das políticas sobre gênero e raça. Lingard concluiu que uma análise pós-moderna sozinha não é suficiente para definir uma política estratégica para combater as injustiças sociais reveladas pela pesquisa de Ball. A idéia de que há efeitos de primeira e de segunda ordem evidencia a preocupação de Ball com as questões de justiça social, padrões de acesso e oportunidades sociais.
Com base em algumas dessas críticas, Vidovich (2002) sugeriu certas modificações no referencial teórico-analítico inicial. A autora sugere que: (a) há necessidade de se estender o terreno do contexto de influência de uma nação individual para o contexto global, algo que também foi considerado por Ball em textos subseqüentes; (b) a influência do Estado precisa ser incorporada de forma mais ampla do que está evidente na abordagem delineada por Ball; e (c) é necessário destacar, explicitamente, as inter-relações entre os diferentes níveis e contextos do processo político (macro, intermediário e micro) ao examinar como esses contextos estão continuamente inter-relacionados.
Apesar de tais críticas, pode-se afirmar que a abordagem do ciclo de políticas oferece instrumentos para uma análise crítica da trajetória de políticas e programas educacionais.


Resumo de Gestão – Textos 5,6,7 e 8
Texto 5 - A GESTÃO DA EDUCAÇÃO ANTE AS EXIGÊNCIAS DE QUALIDADE E PRODUTIVIDADE DA ESCOLA PÚBLICA
Qualidade e produtividade
Muito se tem falado, nos últimos anos, sobre qualidade do ensino e produtividade da escola pública. O discurso oficial, sustentado inclusive por argumentos de intelectuais.
Assegura que já atingimos a quantidade, restando, agora, apenas buscar a qualidade, como se fosse possível a primeira sem a ocorrência da segunda. Quando se referem à quantidade, ressaltam que não há carência de escolas, visto já estar sendo atendida quase toda a população em idade escolar.
É preciso perguntar se escola não seria mais do que um local para onde afluem crianças e jovens carentes de saber, que são acomodados em edifícios com condições precárias de funcionamento (com falta de material de toda ordem, com salas numerosas, que agridem um mínimo de bom senso pedagógico) e são atendidos por funcionários e professores com salários cada vez mais aviltados (que mal lhes permitem sobreviver, quanto mais exercer com competência suas funções).
É preciso perguntarmos a respeito do que entendemos por educação de qualidade. A educação, entendida como a apropriação do saber historicamente produzido é prática social que consiste na própria atualização cultural e histórica do homem. Para que a humanidade não tenha que reinventar tudo a cada nova geração, fato que a condenaria a permanecer na mais primitiva situação, é preciso que o saber esteja sendo permanentemente passado para as gerações subseqüentes. Essa mediação é realizada pela educação, do que decorre sua centralidade enquanto condição imprescindível da própria realização histórica do homem.
Esta concepção de educação é integrante de uma visão do homem histórico, criador de sua própria "humanidade" pelo trabalho. Mas o trabalho, em seu papel mediador, embora categoria central, não é fim em si mas o meio pelo qual o homem transcende a mera necessidade natural. O homem não almeja apenas estar no mundo; o homem almeja estar bem.
O ser humano coloca-se sempre novos objetivos que transcendem a necessidade natural, os quais ele busca realizar por meio do trabalho. O trabalho não é, pois, o fim do homem, mas sua mediação para o viver bem.
Isso tudo tem implicações mais do que importantes para uma educação escolar que tenha por finalidade a formação humana. Em primeiro lugar, é preciso ter presente que não basta formar para o trabalho, ou para a sobrevivência, como parece entender os que vêem na escola apenas um instrumento para preparar para o mercado de trabalho ou para entrar na universidade (que também tem como horizonte o mercado de trabalho). Se a escola deve preparar para alguma coisa, deve ser para a própria vida, mas esta entendida como o viver bem, no desfrute de todos os bens criados socialmente pela humanidade. Um segundo aspecto não basta a escola "preparar para" o bem viver, é preciso que, ao fazer isso, ela estimule e propicie esse bem viver, ou seja, é preciso que a escola seja prazerosa para seus alunos desde já. A primeira condição para propiciar isso é que a educação se apresente enquanto relação humana dialógica, que garanta a condição de sujeito tanto do educador quanto do educando.
A escola é uma das únicas instituições para cujo produto não existem padrões definidos de qualidade.Os efeitos da educação sobre o indivíduo se estendem, às vezes, por toda sua vida, acarretando a extensão de sua avaliação por todo esse período. É por isso que, na escola, a garantia de um bom produto só se pode dar garantindo-se o bom processo. Isto relativiza enormemente as aferições de produtividade da escola baseadas apenas nos índices de aprovação e reprovação ou nas tais avaliações externas que se apoiam exclusivamente no desempenho dos alunos em testes e provas realizados pontualmente.
A produtividade da escola mede-se, portanto, pela realização de seu produto, ou seja, pela proporção de seus alunos que ela consegue levar a se apropriar do saber produzido historicamente. Isto supõe dizer que a boa escola envolve ensino e aprendizagem ou, melhor ainda, supõe considerar que só há ensino quando há aprendizagem.
Além disso, há que se atentar para a peculiaridade do processo pedagógico: o objeto de trabalho é também sujeito, posto tratar-se do ser humano que, como tal, é preciso querer aprender para que o processo se realize com êxito. Levar o aluno a querer aprender é a tarefa primeira da escola da qual dependem todas as demais.

Gestão Democrática da Escola
Assumida uma concepção peculiar de qualidade e de produtividade .da escola, é importante considerar as implicações de ordem administrativa daí decorrentes. Em nosso dia-a-dia, administração (ou gestão, que será aqui tomada como sinônimo) costuma ser associada com chefia ou controle das ações de outros.
Todavia, se sairmos das concepções cotidianas e nos aprofundarmos na análise do real, perceberemos que o que a administração tem de "essencial" é o fato de ser mediação na busca de objetivos.
Esta concepção da administração enquanto mediação traz, inicialmente, duas conseqüências importantes. Em primeiro lugar, ela nos possibilita identificar como não-administrativas todas aquelas medidas ou atividades que, perdendo de vista o fim a que deveriam servir, erigem-se em fins em si mesmas, degradando-se naquilo que Sánchez Vázquez (1977) chamaria de práticas burocratizadas. De passagem, pode-se ressaltar que o que há de odioso, comumente, nas atividades assim chamadas de burocráticas não é a papelada que costuma acompanhá-las, mas sim o fato de que são práticas inúteis aos fins, pois que se tornam fins em si. Em política educacional, essa burocratização dos meios tem prestado, muitas vezes intencionalmente, para se evitar que se alcancemos fins declarados.
Uma segunda decorrência do caráter de mediação da gestão ou administração é que, não sendo fim em si, ela pode articular-se com uma variedade infinita de objetivos, não precisando estar necessariamente articulada com a dominação que vige em nossa sociedade. Mas isto não deve servir a qualquer pretexto de imputar-lhe uma neutralidade que não existe.
Se está envolvida a educação, é importante, antes de mais nada, levar em conta os objetivos que se pretende com ela. Então, na escola básica, esse caráter mediador da administração deve dar-se de forma a que tanto as atividades-meio (direção, serviços de secretaria, assistência ao escolar e atividades complementares, como zeladoria, vigilância, atendimento de alunos e pais), quanto a própria atividade-fim, representada pela relação ensino-aprendizagem que se dá predominantemente (mas não só) em sala de aula, estejam permanentemente impregnadas dos fins da educação. Se isto não se dá, burocratiza-se por inteiro a atividade escolar, fenômeno que consiste na elevação dos meios à categoria de fins e na completa perda dos objetivos visados com a educação escolar.
Se se pretende, com a educação escolar, concorrer para a emancipação do indivíduo enquanto cidadão partícipe de uma sociedade democrática e, ao mesmo tempo, dar-lhe meios, não apenas para sobreviver, mas para viver bem e melhor no usufruto de bens culturais que hoje são privilégio de poucos, então a gestão escolar deve fazer-se de modo a estar em plena coerência com esses objetivos.
Por isso, é preciso refutar, de modo veemente, a tendência atualmente presente no âmbito do estado e de setores do ensino que consiste em reduzir a gestão escolar a soluções estritamente tecnicistas importadas da administração empresarial capitalista. Segundo essa concepção, basta a introdução de técnicas sofisticadas de gerência próprias da empresa comercial, aliada a treinamentos intensivos dos diretores e demais servidores das escolas para se resolverem todos os problemas da educação escolar.
Por um lado, é preciso considerar que os problemas que afligem a educação nacional têm sua origem, fundamentalmente, não na falta de esforços ou na incompetência administrativa de nossos trabalhadores da educação de todos os níveis, mas no descasa do Estado no provimento de recursos de toda ordem que possam viabilizar um ensino escolar com um mínimo de qualidade. Não é possível administração competente de recursos se faltam recursos para serem administrados.
Por outro lado, é necessário desmistificar o enorme equívoco que consiste em pretender aplicar, na escola, métodos e técnicas da empresa capitalista como se eles fossem neutros em si.
Se, os fins humanos (sociais) da educação se relacionam com a liberdade, então é necessário que se providenciem as condições para que aqueles cujos interesses a escola deve atender participem democraticamente da tomada de decisões que dizem respeito aos destinos da escola e a sua administração. Entendida a democracia como mediação para a realização da liberdade em sociedade, a participação dos usuários na gestão da escola inscreve-se, inicialmente, como um instrumento a que a população deve ter acesso para exercer seu direito de cidadania. Isto porque, à medida que a sociedade se democratiza, e como condição dessa democratização, é preciso que se democratizem as instituições que compõem a própria sociedade.
A democratização da gestão da escola básica não pode restringir-se ao limites do próprio estado, promovendo a participação coletiva apenas dos que atuam em seu interior mas envolver principalmente os usuários e a comunidade em geral, de modo que se possa produzir, por parte da população, uma real possibilidade de controle democrático do Estado no provimento de educação escolar em quantidade e qualidade compatíveis com as obrigações do poder público e de acordo com os interesses da sociedade.
Enquanto relação dialógica, a educação escolar pressupõe a condição de sujeito do educando, o que já envolve sua participação ativa no processo. Enquanto fenômeno social mais abrangente, o processo educativo não pode estar desvinculado de tudo o que ocorre fora da escola, em especial no ambiente familiar.
A participação da população na escola ganha sentido, assim, na forma de uma postura positiva da instituição com relação aos usuários, em especial aos pais e responsáveis pelos estudantes, oferecendo ocasiões de diálogo, de convivência verdadeiramente humana, em suma, de participação na vida da escola. Levar o aluno a querer aprender implica um acordo tanto com educandos, fazendo-os sujeitos, quando com seus pais, trazendo-os para o convívio da escola, mostrando-lhes quão importante é sua participação e fazendo uma escola pública de acordo com seus interesses de cidadãos.

Texto 6 - A GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO NO CONTEXTO DA REFORMA DO ESTADO
A luta pela universalização da educação básica sempre esteve apartada da defesa da democratização do ensino superior público. O que se observa na história da educação brasileira é o desenvolvimento das duas modalidades de ensino como dois sistemas distintos.
Segundo Savianni (1999) existe muita imprecisão no emprego do termo sistema de ensino. Para o autor, só é possível falar em um único sistema educacional, visto que "o sistema resulta da atividade sistematizada; e a ação sistematizada é aquela que busca intencionalmente realizar determinadas finalidades".
Fica evidente a inadequação do uso dos termos sistema de educação superior e sistema de educação básica para referir-se à organização dos diferentes graus de ensino, Embora largamente utilizada nos meios acadêmicos e políticos, a distinção entre as duas modalidades não contribui na compreensão global da educação pública e corrobora para uma segmentação que só dificulta o debate em torno da democratização do acesso ao ensino.
A educação básica sempre foi tratada como um sistema à parte daquele que controla e organiza as Instituições de Ensino Superior (IES). A maior evidência da referida distinção parece repousar nas duas leis que reformaram, durante o período militar, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) n°4.024 de 1961. Em 1968, através da Lei n °5.540, o regime militar reformou a universidade brasileira e em 1971, com a Lei n°5.692, procedeu as reformas no ensino de 1°e'2°graus. Durante mais de duas décadas a educa cão brasileira conviveu com uma normatização jurídica própria para cada uma de suas modalidades.
O fato de que o atual Conselho Nacional de Educação se organiza em duas câmaras, de educação básica e educação superior, pode ser um elemento a mais a contribuir para uma falsa e indesejável separação entre as duas modalidades de ensino.

A democratização da educação no âmbito da atual reforma do Estado
A luta pela democratização da educação básica sempre mobilizou as camadas mais populares e revestiu-se de um aspecto de indissociabilidade entre educação e trabalho, ou escola e emprego. Tal luta misturou-se muitas vezes com a defesa da sobrevivência e da obtenção de padrões mínimos de satisfação das necessidades vitais. Já a defesa da democratização da educação superior sempre arrebanhou seus guardiões nas fileiras das camadas médias e intelectuais. A luta pela educação básica trouxe desde sua origem a concepção de democratização como acesso universal, como um imperativo, o que resultou na priorização no âmbito das políticas públicas, pelo menos por determinado tempo, dos aspectos quantitativos em detrimento dos qualitativos.
Na concepção liberal clássica a educação, a saúde, a previdência entre outros, são considerados serviços essenciais que cabe ao Estado garantir a todos os seus cidadãos. Por essa razão a educação figura como política pública.
Ocorre que a eficiência de um Estado pode ser medida e questionada a partir da sua performance em relação às políticas públicas.
Diniz (1997) define a crise de governabilidade, assiste-se ao recurso à burocracia, à eficácia técnica na condução das políticas públicas, como tentativa por parte dos estados de tentarem resgatar sua legitimidade.
Diante de grandes pressões populares pela democratização, sobretudo da educação básica, implicando a exigência de seu acesso, mas também na qualidade de seus serviços -- fator indispensável à perma­nência dos alunos na escola e à conclusão de sua escolaridade , o Estado procura atender de forma ambivalente a essa demanda. Por um lado; dispõe de medidas que procuram dar respostas imediatas às manifestações sociais mais patentes e, por outro, tenta compatibilizar o atendimento das demandas com urna política de contenção dos gastos públicos sem, contudo, abrir mão da direção do processo de mudanças.
A tentativa por parte do Estado de capitanear o processo de mudanças na educação, que ocorre na década de 90, será fundada no discurso da técnica e na agilidade administrativa. Para tanto, as reformas implementadas na educação no período mencionado serão implantadas de forma gradativa, difusa e segmentada, porém com rapidez surpreen­dente e com mesma orientação. A lógica assumida pelas reformas estruturais que a educação pública vai viver no Brasil em todos os âmbitos (administrativo, financeiro, pedagógico) e níveis (básica e superior) tem um mesmo vetor. Os conceitos de produ­tividade, eficácia, excelência e eficiência serão importados das teorias administrativas para as teorias pedagógicas.
Na educação, especialmente na Administração Escolar, verifica-se a transposição de teorias e modelos de organização e administração empresariais e burocráticos para a escola como uma atitude freqüente. Em alguns momentos tais transferências tiveram por objetivo eliminar a luta política no interior das escolas, insistindo no caráter neutro da técnica e na necessária assepsia política da educação.
O raciocínio eficientista incorporado às reformas educacionais dos anos 90, no que se refere à educação básica, tem suas origens na crise de legitimidade que o Estado e, conseqüentemente, o setor educacional enfrentam, a partir de meados da década de 80, quando não conseguem responder nem quantitativa nem qualitativamente às pressões sociais em torno da educação pública.
O problema localizava-se na alocação das vagas, ou seja, na distribuição espacial e temporal das mesmas. A distribuição espacial refere-se à má alocação geográfica das vagas. A construção concentrada de escolas em certas regiões onde o clientelismo político favoreceu tal iniciativa, ou mesmo nos grandes centros urbanos, fez com que 75% da ausência de vagas se concentrasse numa mesma região, no caso o Nordeste rural8.
O que pode ser caracterizado como distribuição temporal refere-se ao fenômeno que ficou conhecido corno "fracasso escolar": a persistência de altas taxas de evasão _e repetência. As vagas praticamente correspondiam à demanda da população em idade regu­lar, porém as altas taxas de repetência e evasão nas séries iniciais não permitiam o ingresso de novos alunos.
A partir de estudos como o de Ribeiro (1991), que demonstravam ser o problema do fracasso escolar muito mais de repetência que evasão, as tradicionais formas de ava­liação começam a ser apontadas como responsáveis pela crise educacional.
A defasagem idade/ série passou a ser estabelecida como importante critério de mensuração de desempenho escolar, constituindo-se em medida estatística largamente utilizada pelo Estado como indicador na avaliação das políticas públicas para a educação básica.
A possibilidade de controle do rendimento dos alunos peia sua progressão nas séries, obedecendo a urna idade-padrão, é medida que só é passível de significado a partir da lógica temporal, imprimida pelo modelo seriado na organização escolar e na delimitação do direito à educação, dentro de faixas etárias determinadas. Até final da década de 80, onde o direito à educação pública e gratuita estava condicionado à idade.
É a partir da década de 70 a obrigação do Estado era com os indivíduos entre 7 e 14 anos. O que passou a ocorrer com a educação pública no Brasil foi que os indivíduos que conseguiam ter acesso a ela, na sua grande maioria, não obtinham o certificado de conclusão do ensino primário na idade prevista.
Para os gestores da educação pública, contudo, a questão se apresentará como um problema econômico, de ordem administrativa. Em um contexto favorável à reforma dos serviços públicos e ao enxugamento da máquina burocrática, os argumentos em favor da racionalização administrativa levarão ao estudo de soluções para o problema, em que a contenção de gastos e a otimização dos recursos passam a ser o principal alvo.
Devendo o Estado, investir na racionalização administrativa do setor educacional para solucioná-lo.
O texto da Emenda Constitucional n°19 de junho de 1998 reflete com muita clareza a lógica racional impressa na reforma do Estado em curso. A possibilidade de criação das Organizações Sociais e dos Contratos de Gestão vai interferir nos rumos que tomará o debate em torno da Autonomia Universitária, o que converge com as orientações mais recentes para a gestão da educação básica. Sendo que, na gestão da educação básica, as reformas realizadas em âmbito estadual e até municipal, em alguns casos, anteciparam as diretrizes assumidas posteriormente pelo MEC.
A proposta de lei sobre autonomia universitária, apresentada pelo MEC, no primeiro semestre de 1999, explicitou as intenções do governo de modificar o papel das universidades federais, estimulando a maior abertura e adequação das mesmas às demandas do mercado. Tal proposta limitou-se a definições de cunho administrativo e finan­ceiro, apresentando, assim, urna leitura ambígua do mencionado artigo 207 da Constituição Federal, ao reconhecer que em relação à autonomia didático-científica o mesmo auto-aplicável, o que não ocorria para suas outras dimensões.
De acordo com Abrucío (1999), o estabelecimento de relações contratuais por parte do Estado baseia-se em três pressupostos. O primeiro é de que, numa situação de falta de recursos, a melhor forma de aumentar a qualidade é introduzir relações contratuais de competição e de controle. O segundo, quase como conseqüência do primeiro, é de que a forma contratual evita a situação de monopólio. E, finalmente, o terceiro refere-se à maior possibilidade que os consumidores (supostamente) têm de controlar e avaliar o andamento dos serviços públicos a partir de um marco contratual.

A democratização do ensino público: da educação básica à superior
Os anos 90 irão refletir um contexto em que a luta pela democratização do ensino assume, no âmbito da educação básica, o caráter da qualidade, da busca de. permanência e da conclusão da escolaridade corno um direito social. Ao mesmo tempo o Estado procurará imprimir maior racionalidade à gestão da educação pública, buscando cumprir seus objetivos, equacionar seus problemas e otimizar seus recursos, adotando em muitos casos o planejamento por objetivos e metas.
São por tais razões que a luta pela universalização do ensino levou à defesa da gestão democrática da educação pública.
A luta pela democratização da educação básica, então, assume o aspecto de ampla defesa do direito à escolarização para todos, à universalização do ensino e à defesa der maior participação da comunidade na gestão da escola. Já a defesa da autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial dominou o terreno da educação superior. As duas reivindicações acabaram sendo, de alguma maneira, contempladas na Constituição Federai de 1988.
Se a educação básica é assumida como o mínimo e que todos têm direito, a educação superior é concebida como privilégio, uma distinção. O próprio discurso em defesa da escola pública, muitas vezes, assume a argumentação de que os recursos inves­tidos na educação superior deveriam ser revertidos para a base do sistema educacional.
Durante muitos anos acreditou-se que, para se cursar uma universidade de qualidade, era preciso ingressar em uma instituição pública e, para tanto, seria necessário se preparar em escolas privadas, únicas capazes de oferecer uma educação básica com qualidade compatível. O que seria explicado pelo fato de que quem cursava escola básica particular tinha seu acesso garantido na universidade pública, já aqueles que só tinham condições de realizar seus estudos na rede pública estavam condenados ao ensino superior privado, com sua extensa estratificação.
Tal crença começou a ser abalada a partir de estudos e pesquisas, muitos realizados no âmbito das próprias universidades, que vieram demonstrar que os alunos de escola básica publica também têm acesso às universidades públicas, podendo existir uma estratificação por cursos.
Na educação básica, a luta sempre foi pela incorporação de todos, o que provavelmente ajudou a constituir a enorme malha pública de educação que temos no Brasil. Apesar da grande concentração da matricula na educação básica situar-se no setor público, a realidade do ensino superior esta longe de ser esta.

A democratização de educação: gestão e avaliação
Durham (1998) constata que no debate atuai sobre ensino superior os temas mais amplos são: autonomia, democratização e avaliação.
A crise de financiamento sempre foi utilizada como o principal argumento inibidor da universalização do acesso à educação pública básica e superior. Na atualidade, tal argu­mento vem acompanhado da necessidade de instituir formas mais flexíveis de gestão, que contemplem a possibilidade de captação de recursos e o maior envolvimento da sociedade nos mecanismos decisórios. Por isso, as políticas mais recentes têm atribuído maior ênfase ao planejamento descentralizado e aos processos de avaliação, como critérios de financiamento e custeio.
Na educação básica tal tendência apresenta-se predominante a partir das reformas educacionais dos anos 90, que elegem a escola como núcleo da gestão17. Também nesse caso, as reivindicações por maior autonomia para as escolas têm sido respondidas pelo Estado com a. possibilidade da descentralização administrativa e financeira. A autonomia pedagógica, compreendida como a liberdade de cada escola construir o seu projeto pedagó­gico, tem caráter limitado já que, em muitos casos, tais projetos são elaborados de acordo com critérios de produtividade definidos previamente pelos órgãos centrais e garantidos pelos processos de avaliação.
Termos como qualidade, eqüidade, eficiência, produtividade, efetividade e descentralização, entre outros, são empregados de forma indiscriminada nas atuais políticas públicas para a educação, chegando muitos deles a perder o seu real significado. Além disso, o uso desses conceitos revela contradições impressas nas orientações gerais das reformas em curso.
A evidência da forte influência que a reforma do Estado, sobretudo a reforma administrativa, vem exercendo sobre o setor educacional começa a ser demonstrada na literatura recente sobre o tema19. Trindade (1999), citando Durham, vai enfatizar a tendência apontada pela autora nas políticas educacionais do momento, que têm como cerne de suas propostas para o setor público a alteração da relação entre as instituições de ensino superior e o Estado. Tal tendência se evidenciaria na substituição do sistema altamente burocrático e centralizado, baseado no financiamento incrementai para um outro calcado na contenção de gastos públicos, na descentralização administrativa e na introdução de processos de avaliação,
A política de Gratificação por Estímulo à Docência (GED), implementada pelo MEC em 1998, apôs movimento grevista dos professores universitários, reforça exatamente a tendência, cada vez mais assumida pelo Estado, de vincular financiamento e avaliação.
Ao mesmo tempo que é exigido dos professores mais presença em sala de aula e produção acadêmica, de caráter científico, reforçam-se as incumbências administrativas, em face da redução de pessoal. Percebe-se a tentativa de abordagem do trabalho acadêmico como composto por atividades mensuráveis em termos quantitativos, com pouco tempo destinado à reflexão e ao estudo e constantemente posto à prova acerca de sua operacionalidade. Expõem-se assim, os professores, a uma realidade em que todos devem competir com seus pares, dificultando a integração coletiva e escasseando a possibilidade cie práticas mais solidárias nas suas atividades de trabalho.
Para Florestan Fernandes, entre as razões que levaram a universidade a assumir novos papéis estava a condição desprovida de recursos materiais a que foi obrigada, o que submeteu seus profissionais a baixos salários e ao aviltamento dos padrões de trabalho intelectual, por carência de meios. Tudo isso levou a que os profissionais universitários aderissem ao que o autor denominou "a simulação de uma avançada política de modernização cultural e autônoma".
Na educação a avaliação assume ainda outros aspectos, pois sempre esteve presente como um importante instrumento, quer de controle das políticas educacionais quer dos processos de aprendizagem. Por tais razoes, no setor educacional, é sabido que os processos de avaliação são desejáveis e indispensáveis ao desenvolvimento da educação. Porém, a literatura recente vem indicando a necessidade de rever os princípios e objetivos e" ainda os usos que se tem feito dos últimos programas de avaliação adotados pelos governos.
O Exame Nacional de Cursos, vulgarmente conhecido por Provão, o Exame Nacio­nal do Ensino Médio (ENEM) e as avaliações realizadas pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica ÍSAE8) têm adotado como indicadores de qualidade e eficiência critérios orientados pela lógica da reforma do Estado. A legitimidade dos sistemas de avaliação é buscada junto à opinião publica através de ampla divulgação pelo MEC nos meios de comunicação
As razões para a aparente aceitação, apresentada pelo senso comum, a esses processos, às vezes tão distantes de sua realidade imediata, precisam ser melhor observa­das.
Os processos de avaliação, adotados pelo atual governo, nutrem-se da confiança identificada por Gíddens (1991) nos sistemas abstratos, para a legitimação de resultados que reduzem e minimalizam o papel e função da universidade como na ótica de Fernandes (1989), bem como de Chauí (1999). A autora denuncia a tentativa das políticas governa­mentais de reduzir as universidades produtoras de conhecimento a Organizações Sociais, orientadas para uma lógica produtivista, que tem corno alvo o mercado consumidor.
Talvez possamos atribuir a busca de exploração da confiança nos sistemas peritos de Giddens â força com que o governo e a imprensa divulgam junto à opinião pública os resultados obtidos nos testes de avaliação, realizados com alunos recém-saídos do ensino médio e dos cursos de graduação. Tais resultados têm a pretensão de se consolidar como os principais balizadores da política de financiamento e autorização de cursos e instituições de educação superior, ao mesmo tempo que almejam a certificação de competências para o mercado de trabalho.
Segundo Durham, as universidades brasileiras organizaram-se, no período mais recente, sob uma orientação mais profissionalizante.
Eleger o mérito acadêmico como principal elemento de seleção e a competência técnica corno o melhor requisito parada gestão da coisa pública implica necessariamente em negar a existência de direitos sociais, ou reconhecer que a igualdade só é possível na forma da lei, visto que não o é no aspecto econômico.
Aceitar que a atuai situação da educação brasileira, que levou a um certo "consenso" da necessidade de reformas, poderá ser equacionada nos marcos do capitalis­mo é reduzi-la a urna mera questão de escolhas administrativas. Mas, ainda assim, tal abordagem encontraria dificuldades, pois "em mesmo os proponentes dessas mudanças as têm avalizado, na sua integralidade, corro capazes de solucionar os problemas detectados. Diante de tá! situação, só resta, inferir que ou os problemas encontrados não são os mesmos e, portanto, não existe consenso, ou, sem dúvida, as soluções buscadas deveriam ser outras.


Texto 7 - Gestão, formação docente e inclusão: eixos da reforma educacional brasileira que atribuem contornos à organização escolar
A reforma e a organização escolar
A atual reforma educacional, que se inicia no Brasil nos anos de 1990, tem como um de seus marcos a elaboração do Plano Decenal de Educação (previsto para vigorar de 1993 a 2003). Este plano derivou da Conferência Mundial sobre Educação para
Todos, realizada em Jomtien, Tailândia, em 1990.Outros eventos e seus respectivos documentos passam a indicar a necessária reforma educacional brasileira. Percebe-se, nesse movimento, a influência de organismos internacionais na proposição política para a educação nacional. Para Torres (1996), o Banco Mundial destaca-se entre as várias agências ao apresentar uma proposta articulada em relação à educação nos países em desenvolvimento que abrange “ das macropolíticas até a sala de aula”.
É no embate entre a proposição política e o cotidiano da escola que esta vai constituindo-se e organizando-se. É justamente nessa relação que se faz importante refletir sobre a política educacional em curso e o papel atribuído à educação e à escola no Brasil.
Por compreender a política educacional como uma política pública, considero que, por meio dela, os governos definem, organizam, materializam mudanças para a área em questão. Porém, as políticas educacionais não estão sozinhas na sociedade. Ao contrário, relacionam-se de maneira intrínseca à realidade social mais ampla. Nesta perspectiva, as mudanças que ocorrem na sociedade buscam na educação um alicerce.
As reformas sociais em curso propõem mudanças em relação a diferentes aspectos. Um deles diz respeito à reforma do Estado. Para a manutenção do capitalismo, o neoliberalismo (ou neoconservadorismo) vem propondo modificações em relação ao papel que o Estado deve desempenhar.
Em relação à educação, e especificamente sobre o trabalho na escola, a mudança no papel do Estado pode ser pensada por, no mínimo, dois pontos:
a) o Estado retrai-se na provisão, destacando o papel da unidade escolar como responsável pela educação das crianças, jovens e adultos, mas mantendo o controle do que é feito pela escola por meio da avaliação (SAEB –  Sistema de Avaliação da Educação Básica,ENEM –  Exame Nacional do Ensino Médio,ENC –  Exame Nacional de Cursos);
b) a retirada do Estado como provedor se dá mediante a entrada da sociedade civil nas unidades escolares para auxiliar na resolução de problemas, principalmente por meio de programas como, por exemplo, o Programa Amigos da Escola e o Programa Adote um Aluno.
Tais pontos indicam que a mudança no papel do Estado leva a alterações nas relações dentro da escola, com a entrada nesse espaço de pessoas a desempenharem funções que historicamente cabiam aos professores; com o controle do que é trabalhado dentro de sala de aula, com base nos resultados que os alunos apresentam nas avaliações externas ao processo ensino-aprendizagem; com a necessária articulação entre escola e comunidade, porém agora com esta última sendo chamada a “ resolver”, juntamente com a escola, os problemas mais imediatos (principalmente os relacionados à manutenção financeira da escola).
Se, por um lado, a organização por série tem como um de seus principais problemas a rigidez de tempo, do currículo e da avaliação, que levam a altos índices de fracasso na escola e a conseqüente evasão, por outro lado, a organização por ciclos flexibiliza o tempo, o currículo e a avaliação durante o período do ciclo. Mas no término de cada ciclo essa inflexibilidade reassume o processo ensino-aprendizagem, levando, em muitos casos, ao fracasso. Outro ponto a ser destacado é o de que se flexibilizam tanto os componentes do processo ensino-aprendizagem que se acaba por proporcionar educação diferente para pessoas diferentes.
Freitas nos indica que “ Parece que estamos diante de um fenômeno antigo e resistente”,pois a escola não conseguiu superar o problema que historicamente está posto para ela, qual seja, ensinar todas as crianças e jovens. O papel que o Estado vem desempenhando, então, é o de consolidar as desigualdades sociais por meio da escola. Nesta relação podemos inferir que a reforma educacional no Brasil perpassa por alguns pontos cruciais como a gestão, o financiamento, a avaliação, a formação de professores, o currículo, a inclusão.

Organização escolar: a gestão, a formação docente e a inclusão
A gestão como organizadora da educação e da escola
Para Oliveira (2000, p. 331), “ as reformas educacionais dos anos 90 apresentam como seu principal traço a tentativa de ‘modernização’  administrativa do aparato público”. Tendo por base a crítica ao modelo centralizado de planejamento, a reforma de Estado iniciada no Brasil nos anos de 1990 vem substituindo o planejamento centralizado pela flexibilização da gestão.
Na reforma educacional, esse planejamento apresenta-se de maneira flexibilizada, indicando um novo modelo de gestão do ensino público. Agora descentralizada, a gestão deve assumir uma forma mais flexível e participativa.
A flexibilização como marca desses modelos da gestão
[...] se por um lado incorpora antigas conquistas dos movimentos organizados e das resistências dos trabalhadores às formas capitalistas de organização e gestão do trabalho, por outro, o fazem atribuindo-lhes novos significados,o que faz com que tenham na aparência conteúdos mais consensuais, mas na sua prática efetiva conservem pressupostos autoritários. (idem, p. 95-96).
A municipalização vem sendo utilizada pelo governo federal muito mais como um processo que possibilita à União o repasse do encargo sobre a educação básica. Para Portela de Oliveira (2002), “ a municipalização é, certamente, a transferência de encargos de uma esfera à outra, mas isso não significa, necessariamente, um processo de ‘democratização’ , sentido com o qual é positivamente percebido pelo senso comum”.
Nessa linha de raciocínio, a escola passa a ser o“ foco” da gestão administrativa e financeira.
Salienta-se que a busca por autonomia pedagógica das escolas públicas foi uma luta constante da comunidade escolar, das organizações representativas dos profissionais da educação, de intelectuais de esquerda, entre outros, principalmente nos anos de 1970-1980. Buscava-se, naquele momento, a autonomia escolar para a construção dos projetos político-pedagógicos. Em nome dessa “ autonomia”, a política educacional propõe a gestão escolar, descentralizando não a proposta educacional, mas a sua administração e seu financiamento. Atrelada a critérios de produtividade, a reforma educacional atribui significativa relevância aos processos avaliativos, que continuam centralizados na União. Desta maneira, podemos pensar que essa proposta de gestão articula financiamento e avaliação como principais instrumentos (Oliveira, 2000).
Com o discurso de incluir todos os segmentos da sociedade na tarefa de educar as futuras gerações, o governo repassa a responsabilidade dessa educação aos seus próprios beneficiários. Essas mudanças relacionadas à gestão chegam à escola e alteram sua organização e seu cotidiano. Na atualidade, a proposição tem sido descentralizar até chegar à escola. Nessa perspectiva, centra-se na unidade escolar a responsabilidade em “ gerenciar” os problemas que esta e a comunidade ao seu entorno apresentam.
Partindo dessa perspectiva, faz-se necessário que os profissionais da educação, principalmente os professores, assumam a função de gestores da educação. Para tanto, tornou-se imperativo a focalização na formação desse profissional.

O professor como “elo” de ligação entre a escola e a sociedade, e a sua formação
Em vários documentos internacionais está destacada a importância do papel dos professores para responderem às demandas das “ novas” tarefas da educação. A falta de preparo dos professores brasileiros é apontada, pelos órgãos oficiais, como uma das causas mais relevantes do insucesso escolar dos alunos. Documento do Banco Mundial (1995) ressalta que a formação em serviço é uma estratégia eficaz para melhorar o conhecimento dos professores e, principalmente, diminui o custo dessa preparação. Com tal indicação, essa agência conota à educação caráter economicista e impõe uma visão utilitarista e fragmentada para a formação. A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) também destaca a educação à distância como a forma mais apropriada de formar os docentes.
Tais proposições internacionais estão fortemente presentes no projeto de formação de professores apresentado pelo governo brasileiro. A formação docente ganha destaque na política educacional, principalmente a partir da promulgação das novas diretrizes e bases da educação nacional (LDBEN, lei n. 9.394/96).
A aprovação desta lei fez permanecer a ambigüidade quanto ao nível da formação: em nível médio ou nível superior para os professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental.
No ano 2000, com o decreto presidencial n. 3.554, e em 2001, por meio do parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) n. 133, o governo brasileiro indica que a formação dos professores poderia ocorrer nos cursos normais superiores e também nas universidades.
Desta maneira, explicitou-se ainda mais a indefinição quanto ao  locus de formação desses professores. Ou seja, no Brasil, hoje, os professores das séries iniciais do ensino fundamental e das modalidades de ensino podem ser formados tanto nos institutos normais superiores como nos cursos de pedagogia das universidades, além, é claro, da formação em nível médio.
Em 2006, o CNE aprova a Resolução n. 1, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o
Curso de Pedagogia –  Licenciatura (Brasil, 2006), na qual se observa desde a permanência de ambigüidades na formação até a centralidade do saber-fazer na sua proposição. Tal centralidade indica a influência dos ditames dos organismos internacionais na perspectiva da formação desse profissional. Para dar ênfase ao papel do professor sem deixá-lo participar efetivamente das proposições, o governo aponta algumas iniciativas para a formação de professores que podem ser sintetizadas em: flexibilização da formação; as competências a serem desenvolvidas; o aprender a aprender; atendimento à diversidade; centralidade da prática do professor, entre outras.
Essa dicotomia da proposta de formação expressa uma política binária e não relacional (Torres, 1998).Essa perspectiva impele os professores das redes públicas, especificamente aqueles profissionais do ensino fundamental, a procurar sua formação em instituições que prometem formá-los em menos tempo, com menos gastos, entre outros pontos que caracterizam o aligeiramento da formação docente.
Quanto às competências, tão presentes nos documentos políticos, elas dizem respeito ao que o professor deve saber: trabalhar em parceria com a comunidade escolar, resolver problemas da escola, achar soluções criativas a problemas concernentes ao processo ensino-aprendizagem de seus alunos, até mesmo às situações da comunidade em que a escola está inserida.
Observa-se que essa proposição retira de cena as discussões sobre as condições de trabalho dos professores, como se elas estivessem resolvidas.
Essa política faz crer que basta a “ boa vontade” dos professores para que os problemas educacionais se resolvam.
Podemos pensar que o que chamávamos, no Brasil, de formação de professores aparece hoje muito mais como treinamento profissional.

A formação de professores para a educação especial
Para a educação especial, a reforma em andamento prevê, na Resolução CNE n. 02/2001, que os professores que trabalham com alunos “ que apresentam necessidades educacionais especiais” podem seguir dois modelos distintos: os capacitados e os especializados.
A formação dos professores capacitados, tanto em nível médio como superior, deve ocorrer por meio de oferecimento de disciplinas, ou tópicos, que venham a contemplar as discussões sobre a educação de alunos considerados deficientes. Percebe-se também que sua formação deve desenvolver, nesse futuro profissional, competências para executar atividades diretamente com os alunos considerados deficientes e, ao mesmo tempo, aprender a trabalhar em equipe.
Isso porque não serão esses os profissionais que irão planejar as atividades a serem desenvolvidas com esses alunos, mas sim os professores especializados. Já os professores especializados são os responsáveis pela organização das ações pedagógicas a serem desenvolvidas pelos  “ professores capacitados”. Estes devem ter sua formação em nível superior ou em nível de especialização.
Quanto aos professores que já estão exercendo o magistério, o parágrafo 4º do artigo 18 especifica que lhes devem ser oferecidas “ oportunidades de formação continuada, inclusive em nível de especialização, pelas instâncias educacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.
Segundo a Resolução CNE n. 02/2001,tanto os professores capacitados como os especializados podem ser formados em dois níveis. Os primeiros em nível médio ou superior, e os segundos em nível superior ou em pós-graduação. Também são formadores desses professores os cursos de complementação e de formação em serviço.
Podemos notar a variação de níveis e tipos de formação de professores possibilitada pela atual legislação para a educação especial. Assim como para a educação regular, a proposta de formação de professores para a educação especial fortalece a tese de permanência e naturalização da ambigüidade quanto ao nível de formação.
Em síntese, podemos apreender que a proposição atual de formação de professores, tanto capacitados como especializados, não rompe com o modelo de formação tradicionalmente destinado à área. Com base nas contribuições de Skrtic (1996), é possível afirmar que a educação especial tem, historicamente, se organizado tendo por base o modelo médico-pedagógico. Este modelo chega mesmo a ser confundido com o conhecimento da educação especial e passa a organizar o currículo do curso de formação de seus professores, a indicar o trabalho a ser desenvolvido com os alunos considerados deficientes, a influenciar as políticas públicas voltadas à educação especial, entre outras ações que envolvem a área.
Alguns estudos nos fazem compreender que a dificuldade da área em aceitar a crítica a esse modelo médico-pedagógico está relacionada ao pensamento hegemônico, não somente na educação especial, mas na educação de maneira geral, que tem a base biológica como explicação para o insucesso escolar. Junto a ela, encontramos a sustentação psicológica de que o fracasso escolar decorre de questões individuais, e não sociais.

A inclusão como política
É no decorrer da década de 1990 que ocorre no Brasil a apropriação do discurso internacional relacionado à inclusão.
A atual política de inclusão, que, segundo Correia não se refere somente à entrada dos alunos considerados deficientes no ensino regular, mas se constitui, mesmo, em uma narrativa que é incorporada pelo campo educacional como “ ideologia da inclusão”.
Para Martins (1997), a inclusão, nessa sociedade, ocorreria por uma via marginal, e a questão da exclusão constitui-se em um falso problema. Em suas palavras: “ O discurso corrente sobre exclusão é basicamente produto de um equívoco, de uma fetichização, a fetichização conceitual da exclusão, a exclusão transformada numa palavra mágica que explica tudo”.
A exclusão e a inclusão são “ representações” dos processos sociais excludentes e includentes, típicos da sociedade capitalista. Uma só existe em relação à outra. Ou seja, “ A inclusão só pode ser pensada pela presença constante da exclusão”.
A partir de leituras das principais publicações da área, foi possível perceber que há divergências relacionadas à apreensão da política de inclusão. Em relação a esta proposição, especificamente relacionada aos alunos deficientes, que há, ao menos, duas tendências neste debate. A primeira delas diz respeito à perspectiva que chamarei de propositiva; a segunda denominarei analítica.
A perspectiva propositiva compreende as produções que: a) tomam a inclusão como um modelo predefinido; b) propõem indicações explícitas de como deve ocorrer a inclusão; c) a partir da sensibilização dos professores, indicam que estes devem ter desenvolvido suas competências para incluir os mais diferentes alunos; e d) discutem a inclusão sem levar em conta as suas reais possibilidades.
Alguns autores tratam a inclusão de alunos considerados deficientes como um problema restrito das competências dos professores. Centram essa discussão nas questões específicas relacionadas à deficiência e pouco discutem a imprescindível tarefa de ensinar esses alunos.
Nas produções consideradas analíticas, encontramos a compreensão de que a história (da sociedade, da educação e da educação especial) é a base para desenvolver um exame cuidadoso da atualidade. Nessa perspectiva, a materialidade das condições históricas e sociais para a inclusão é que possibilita a discussão sobre ela.
A inclusão, então, deve ser analisada à luz das suas reais possibilidades, sem ser tomada como único objetivo. O movimento da sociedade é que possibilita, em maior ou menor grau, a inclusão. Ao mesmo tempo, nessa perspectiva, alunos e professores são sujeitos constituintes e constituidores desse processo, e não vítimas de decisões do “ sistema”.
Essas duas perspectivas, influenciam-se mutuamente e coexistem na educação especial, no âmbito da produção de conhecimento sobre a inclusão de alunos considerados deficientes, sendo provável que também se façam presentes no debate sobre inclusão de maneira geral.
Consolidando o tratamento diferente para as desigualdades produzidas pela própria sociedade capitalista, a perspectiva propositiva faz da inclusão um processo perverso, uma vez que celebra a diferença que exclui.
A partir das análises realizadas, podemos inferir que a reforma educacional, iniciada nos anos de 1990, se aproxima da perspectiva propositiva.
Porém, agora, essa exclusão abandona a forma objetiva (vista na educação por meio da evasão e repetência, principalmente) e configura-se na exclusão subjetiva (Freitas, 2002). Esta última apresenta-se de maneira mais perversa que a primeira, pois deposita no próprio excluído a responsabilidade de sua condição.

Texto 8 - OS ESPECIALISTAS NA EFICÁCIA PARENTAL E OS CONFLITOS NA RELAÇÃO FAMÍLIA E ESCOLA (NOTAS SOBRE CONTRADIÇÕES DO PROCESSO CIVILIZADOR).
1.A Inspiração em Elias :introdução metodológica e afetiva 
As evidências no processo civilizador, podem  ser  visualizadas  tanto  nos  textos  dos denominados  moralistas,  quanto  em mudanças de costumes que se refletem no cotidiano e que irão, aos poucos, dando uma nova  forma  ao  tecido  social.  No  caso  específico  do  tema  deste  texto  as  ações civilizatórias refletiram-se no âmbito da família através de, por exemplo, a ampliação do direito  da  investigação  da  paternidade  no  Brasil  do  início  do  século  passado  que reorganizou  as  relações  entre  homens  e mulheres  de  classes  sociais  diferentes. Um outro exemplo, é o da inserção  de  profissionais  da  área médica,  jurídica  e  educacional  que  se  ocuparam  em ensinar  aos  pais  a  forma mais  correta  de  educar  e  cuidar  de  suas  crianças.  Podemos, pois,  afirmar  que    um  forte  vínculo  entre  o  processo  civilizador  e  a  emergência  do perito (interventores cientificamente legitimados) que propaga como devemos atuar em diferentes campos.
Tomo  como  idéia  central que  a  intervenção dos especialistas para a melhoria da eficácia parental deixa “invisível” a figura materna na escola.
Duas hipóteses que podem ser assim enunciadas. a) a  inserção  da  mulher  no  mercado  de  trabalho  e  o  crescimento  da  importância  dos especialistas  tiveram, por conseqüência, uma  invisibilidade da  família na escola e, em particular,  da  figura  materna.  No  entanto,  como  o  âmbito  educacional  continua  a priorizar  o  apoio  da  família  (e  particularmente  da  mãe)  para  a  realização  de  uma educação  eficaz,  a  invisibilidade  da  mulher/mãe  faz  emergir  conflitos  muitas  vezes insolúveis entre família e escola. b) que o desaparecimento da autoridade (e do seu lado complementar  que  é  a  responsabilidade)  tanto  no  âmbito  da  família  como  da  escola, finda  por  deixar  um  espaço  vazio  nas  relações  entre  pais  e  filhos  e  entre  os  atores educacionais  e  educandos.

2.“Onde está a família”?
A preocupação desta época não se  tornou “coisa do passado” e, por  isto, não me surpreendi quando vi em uma revista de circulação nacional um encarte de uma cartilha  que  ensinava  aos  pais  como  acompanhar  os  estudos  dos  filhos.  Um  outro exemplo é o último número da revista “Gestão Escolar” (2009) destinada a professores e gestores que apresenta como  tema de capa a relação família e escola e cujo subtítulo reforça  a  idéia  da  parceria  necessária  entre  as  instituições.
A da cartilha que é evidentemente uma família de camada média  estruturada  no  modelo  nuclear  (pai  mãe  e  filhos)  ou  da  família  que  hoje  se estrutura (independente da camada social) com arranjos muito diferentes.

3. Para quais caminhos dirigiu-se a aliança família e escola?
O descaso da  família com os seus  filhos, principalmente a mãe cujo  tempo está  focado cada vez mais no mundo do trabalho. Portanto,  fica difícil acertar um  só alvo de  forma a que esta “guerra velada” entre família e escola possa ter fim. Assim, querer tornar a família novamente aliada e cúmplice da educação tem sido uma das grandes bandeiras da escola que, no entanto, se vê muitas vezes perdida sem saber como  “trazer  a  família    de  volta  para  o  âmbito  escolar  de  forma  mais  amigável.  É preciso  pensar,  porém,  que,  se  os  pais  “fogem”  da  escola,  algo  aconteceu  e  é  este  o processo que deve ser recuperado.
Quando se analisa  relação  família e escola, é quase  inexorável voltar-se para o estudo clássico de Áries (1981) que aponta como  já mencionamos o século 19 como o período em que se consolidou a aliança entre ambas. Preocupar-se  com  a  educação  dos  filhos  seria  tão  vital  quanto  à preocupação com sua higiene e saúde.
No  momento  atual,  é  importante  perceber  que  essa  aliança  historicamente construída  apresenta  sinais  de  esgarçamento,  ou  até  mesmo  de  modificações  sociais profundas.
As mudanças operadas tanto no interior da escola quanto na família alteraram e contribuíram para o que denomino esgarçamento da aliança. Um dos  pontos  centrais  é  a  alteração  na  forma  das  crianças  estarem  na  escola, principalmente,  as  decorrentes  da  escola  de  tempo  integral. De  acordo  com  Lovisolo este  formato  fez com que a escola  se  tornasse um  lugar onde a “tia” é  tia de fato. Ou seja, intentou cumprir um papel que não era o seu e, paradoxalmente, atuam no sentido de manter a aliança. Além disto, um outro fenômeno, o do “fim da infância” tem sido  objeto  de  preocupação  dos  educadores  principalmente  no  que  se  refere  a  sua relação  com  o  aumento  da  indisciplina  e  ausência  de  limites  por  parte  de  crianças  e adolescentes. Para os educadores  isto ocorre porque a família  tem, cada vez mais,  tem deixado a cargo da escola noções básicas de  formação. Como conseqüência, a  sala de aula,  corredores  e pátios  se  teria  tornado uma praça de  guerra na maioria das  escolas gerando,  inclusive,  um  novo  fenômeno,  o  bulyng.
Lasch  (1991)  afirma,  dentre  outras considerações, que o  esgarçamento da  aliança  entre  escola  e  família  tem uma  ligação com o surgimento do que ele denomina tutores sociais, isto é, os que se especializaram tanto no  trato com os que estão à margem  (hoje os exemplos mais próximos seriam o Conselho  Tutelar;  os  Conselhos Municipais  da  Infância  e  da  Juventude  e  o  aparato jurídico  que  trata  especificamente  de  questões  que  envolvem  delitos  da  infância  e juventude)  quanto  em  ensinar  comportamentos  adequados  em  todos  os  âmbitos  da sociedade  e mais  particularmente,  na  saúde  e  na  educação  entendida  em  seu  sentido amplo,  isto  é,  na  educação  escolar  e  “não  escolar”,  esta  última  exemplificada  pelas muitas  Organizações  Não  Governamentais  (ONGs)  cujos  projetos  apresentam  como tendência trabalhar com crianças e adolescentes quase sempre no sentido de neutralizar a  possibilidade  de  criação  de  um  futuro  adulto  marginal.
Para Lasch, podemos  situar  a  “crise da  família”  ainda nos  fins do  século 19  e início do século 20. É neste momento, afirma, que o aumento no número de divórcios, a queda da natalidade entre pessoas de nível social elevado e as primeiras manifestações do feminismo desencadearam uma nova mentalidade e, de forma conjunta, uma reação dos  conservadores.
Ainda de acordo com o autor, as  tarefas exercidas pela mãe  foram se  tornando cada  vez  mais  dependentes  dos  especialistas.
No  caso  da  escola  pública  o movimento  é  similar  e  os  professores  tendem  a  fazer  encaminhamentos  para especialistas  agora  também  acessíveis  as  classes  populares.  Tudo  indica  que  a instituição escolar não assume o fracasso, ele está sempre em outras mãos.
A intervenção dos especialistas que transformou deliberadamente a  forma  de  se  viver  o  espaço  doméstico  ao  mesmo  tempo,  e  este  é  um  dado fundamental, consolidou a idéia da incompetência da família de educar para o coletivo e para a solidificação desta visão, participavam principalmente as profissões assistenciais.
As  escolas  em  tempo  integral, cumprem cada vez mais o papel da família. Quando os pais são chamados, na maioria das vezes, é porque a escola quer  (e deve) dizer a eles a maneira como deveriam agir para com seu  filho. E o  interessante é que este  fato ocorre mesmo quando o convite é coletivo, isto é, nas palestras para pais, promovidas pela escola.
Quando  algo ruim  ocorre  (algum  ato  de  indisciplina;  notas  baixas,  por  exemplo)  e  os  pais  são chamados  eles  se  valem  da  idéia  de  que  a  escola  deve  educar  ou,  baseados  em informações  de  natureza  diversa  (mídias  faladas  e  escritas  e  leis  como  o Estatuto  da
Criança  e  do  Adolescente)  querem  interferir  na  forma  como  a  escola  deve  agir  em relação  ao  filho,  particularmente,  no  que  se  refere  às  punições.
O  que  os  pais  fizeram  (e  fazem)  foi  seguir  os  preceitos  das  ciências  que havia  ensinado para  eles que  esta  era  a  forma  correta de  se  comportar  com os  filhos. Eles  aprenderam  sua  lição  e,  portanto,  interpelam  a  escola  quando  esta  coloca  na berlinda a relação de companheirismo que eles devem exercer continuamente com seus filhos.
Para o autor,  teremos cada vez mais crianças crescendo não sobre a autoridade da família e sim educadas pelos princípios de autoridade do Estado que são diferentes. Resta saber o que fazer com este novo  tecido social que emerge como contradição (ou não)  do  processo  histórico  desencadeado  por  mudanças  sociais  profundas  que reverberam no âmbito escolar e, ao mesmo tempo, são mudanças reforçadas por ele.